Primeiro de
abril de 1964, militares com apoio da população civil destituíram João Goulart
e assumiram o poder. Já se foram 48 anos e muitos brasileiros ainda não conhecem
essa parte importante da história do país, principalmente fatos históricos ocorridos em
cidades como Juazeiro. É como se houvesse
uma névoa sobre o passado e tivéssemos receio de ir desvelando os véus que
encobrem essa realidade.
Felizmente,
esses acontecimentos históricos começam a ser desvendados. Em maio deste ano, o
Estado Brasileiro instituiu a Comissão da Verdade, com a finalidade de
examinar, esclarecer as graves violações de direitos humanos, como prisões,
mortes e desaparecimentos, praticados no período de 1964 a 1988. Tudo isso pelo direito à
memória e à verdade histórica, como diz a Lei 12.528/11.
A imprensa
também tem contribuído para buscar esclarecer os fatos históricos. Hoje, no Gazzeta do São Francisco, a jornalista em Multimeios, da
Universidade do Estado da Bahia, Karem Moraes, nos contou parte dessa história
ocorrida na cidade baiana.
Em 12 de maio de 1964, o
vereador Manoel Lopes Sobreira pedia a cassação do representante de Jorge
Gomes, do Partido Democrata Cristão (PDC), preso desde abril, acusado de
subversão e comunismo. Em 14 de maio, a Câmara dos Vereadores, por meio do
projeto de Resolução Número 127, cassa o mandato com a justificativa de que,
estando preso, o vereador não poderia mais representar a Câmara e que a instituição não apoiava nenhuma atitude que denotasse amparo ao
comunismo.
Radialista,
proprietário do jornal Tribuna do Povo junto com o editor José Diamantino Assis
(Zezito), Jorge Gomes não pertencia a nenhuma organização comunista. Foi
vereador por três mandatos de 1951 a 1964.
Com a cassação, a
Câmara dos Vereadores demonstrava que apoiava o golpe de Estado. Contudo, o
vereador era inocente. Em fevereiro de 1965, a Câmara registrou em ata o
recebimento de um radiograma vindo do Exército, que ordenava a volta de Jorge
Gomes às suas funções políticas. De forma íntegra, o ex-vereador recusou-se.
Em carta enviada à
Câmara dos Vereadores, no dia 12 de março de 1965, Jorge Gomes renunciava, de forma irrevogável, ao
mandato e “afirmava aos colegas que não tinha delatado nenhum deles, mesmo
àqueles que assinaram moção de solidariedade ao presidente Jango e ao então
governador de Pernambuco, Miguel Arraes”.
A carta só foi
registrada em ata no mês de novembro. Os vereadores silenciaram, bem como o
gestor municipal, à época, Américo Tanuri.
Assim como Jorge Gomes,
muitas pessoas aguerridas de Juazeiro foram presas, acusadas de pertencer ao
Partido Comunista Brasileiro (PCB). Mestre Osvaldo, da Companhia de Navegação,
o marceneiro Antônio Bigodinho, Seu Saul Rosas, Seu Benedito Pereira, Chico
Romão e outros, cujas histórias de vida nem todos conhecem e que estão no
esquecimento. Todos eles se dedicavam às causas populares e foram acusados
de serem inimigos da nação.
Algumas pessoas são
desaparecidos políticos, como Ruy Frazão, militante do Partido Comunista do
Brasil (PCdoB), preso na feira de Petrolina-PE, na manhã de 27 de maio de 1974.
A família não pode velar o corpo, não teve direito ao luto, ao choro.
Por causa de
episódios tristes como esses, é preciso que se conservem os arquivos
históricos. Muitas instituições, desrespeitando a Constituição Brasileira,
queimaram, destruíram documentos. Felizmente, a Câmara dos Vereadores preservou
as atas, que comprovam a cassação do vereador Jorge Gomes.
É preciso também
que a imprensa procure esclarecimentos históricos sobre o passado. É preciso
lembrar para contar aos nossos filhos, para garantir uma memória e uma verdade
histórica. Para os familiares, sabemos que relembrar o passado é um
momento de sofrimento. Relembrar de um pai, de um tio que sofreu a injustiça de
ser preso, ameaçado na sua integridade física, é retomar um fio de um novelo,
que estava esquecido. São lembranças tristes, causam dor.
Mas é preciso lembrar
para não esquecer. É preciso lembrar para que assassinos não se mantenham
impunes. Parabéns a Karem Moraes e ao
Gazzeta do São Francisco, por nos contar essa história. Somente com acesso
à verdade histórica, poderemos construir o futuro, sem receio do
passado.
Andréa Cristiana
Santos
Olá Professora Andrea Cristiana, que bom que essa história sobre o Golpe Militar na nossa região está sendo investigada, eu tinha curiosidades sobre esse assunto, mas sempre houve pouca informação a respeito, acho até que merece maiores desdobramentos, transmite a minha sugestão: esse tema merece um livro-reportagem...
ResponderExcluirUm grande abraço, sabe que você contribuiu bastante com a minha formação profissional,
Vinicius Gonçalves
Comunicador da Cáritas
Ruy Barbosa-BA
Vinícius, que bom receber mensagem sua. Eu também fico feliz pela iniciativa de Karem Moraes de buscar esclarecer os impactos da repressão militar na cidade e as circunstâncias das prisões.Com certeza, é um excelente livro-reportagem. Karem fez um suplemento com diversas matérias, e eu a orientei no TCC. Mas é preciso que os documentos também se tornem públicos para que possamos conhecer o nosso passado, e possamos, de fato, seguir adiante.
ExcluirPor gentileza, me escreva para saber das novidades e do trabalho. Meu e-mail é o de sempre. Mas também para andcrissantos@gmail.com
Parabéns pelos seus conteudos. Um abraço!
ResponderExcluirObrigada Francisco. Espero que continue a visitar o blog.
ResponderExcluirOlá jornalista Andréa Cristiana!
ResponderExcluirLembro-me bem daquele fatídico primeiro de abril de 1964. No dia anterior, 31 de março, dia do meu aniversário, eu sentia algo estranho no ar, pois estava prevista uma reunião ou comício do pessoal com idéias mais ou menos socialistas, provavelmente à noite e, havia uma certa movimentação da polícia pela cidade, incluindo alguns elementos desconhecidos; acho que tinham chegado de Salvador. O Professor Francisco Romão Carneiro, o Chico Romão era meu Professor de Matemática, no Ginásio Dr. Edson Ribeiro, antigo Ginásio de Juazeiro. E foi pra mim e meus colegas de sala, uma surpresa desagradável, sabermos que nosso Professor havia sido preso. E o pior daquela situação, era o fato de os presos ficarem incomunicáveis. Ninguém sabia nada, como estavam eles nem para onde iriam. Geralmente dizia-se que iriam para Salvador. Acredito que era aquele o destino de todos eles. Lembro-me de que, ao saber da notícia, na porta do Colégio, quase ingenuamente pronunciei a seguinte frase: Esta é a revolução dos canalhas! Não sabia eu que, ali perto de mim, poderia estar um olheiro da polícia. Também eu era muito jovem, inexperiente e um pouco sem juizo. E, a partir daquela data, ninguém mais poderia expressar pensamento algum relacionado com idéias políticas, em especial idéias socialistas. Acho muito importante que se busque, pesquise e principalmente se escreva, sobre 1964 em Juazeiro. Foi uma época em que as mentes jovens de lá fervilhavam de idéias, não só culturais, como também artísticas, científicas e principalmente políticas. Se nosso saudoso historiador Walter de Castro Dourado ainda estivesse vivo, certamente escreveria um livro sobre aquela época e seus acontecimentos, incluindo o Golpe Militar de 1964, ou a Revolução, como diziam os militares de então. Parabéns por levantar esse assunto!
Euvaldo Batista dos Santos
Economista em São Paulo