sábado, 28 de julho de 2012

Zuzu Angel e a luta pelo seu filho


Quem é essa mulher, que canta sempre esse estribilho. Só queria embalar meu filho que mora na escuridão do mar. Nos anos 70, Chico Buarque ousou, a despeito do medo e o horror implantado pelo regime militar, falar da dor de Zuzu Angel em busca do seu filho, Stuart Edgar Angel Jones. Chico renunciou ao silêncio e denunciou o sofrimento de mães que tiveram os filhos assassinados.

Trinta e cinco anos após a morte de Stuart, a luta de Zuzu Angel foi levada ao cinema. O que há de peculiar no drama de Zuzu, corpo e alma dilacerados pelo filho assassinado covardemente, é perceber como o passado está presente nas nossas vidas. Pensar em Zuzu é relembrar o drama de outras mães que tiveram filhos mortos, cujos corpos nunca foram encontrados. É expor, aos nossos olhos, o silêncio da sociedade brasileira que apoiou o golpe militar sob alegação hipócrita de que pretendia restaurar a democracia. 

Qual democracia? Quando os militares destituíram João Goulart, em 1964, romperam com a ordem constitucional e instauraram o autoritarismo, resultando no assassinato dos que se opunham à falta de liberdade política. Como Stuart Edgar, muitos jovens aderiram ao movimento de guerrilha armada porque acreditavam que não deveriam negligenciar a coragem dos que almejam a livre expressão, ousar sonhar, ousar lutar. 

Ainda é uma ferida exposta na sociedade brasileira compreender porque jovens desafiaram o regime militar. Para muitos, eram idealistas sob o fulgor da juventude. Os militares diziam: são jovens comunistas em guerra contra a nação. Porém, como bem retrata o filme, que guerra é esta que condena à morte sem direito à defesa? Os militares não são os únicos a serem responsabilizados pelo aniquilamento de militantes. Empresários financiaram a caça aos supostos comunistas, os meios de comunicação silenciaram sobre suas mortes e se recusaram a falar a verdade. 

Zuzu Angel nos conclama a refletir porque permanece um silêncio sobre esse apoio ao golpe militar e à repressão política. A anistia política aos crimes praticados por militantes e pelos torturadores não significa que devemos esquecer o passado. Pelo contrário, o passado é algo sempre vivo. 

Para os que não querem silenciar sobre o que foi o regime militar, relembremos de um fato ocorrido em Petrolina, em 27 de maio de 1974. Neste dia, o militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) Ruy Frazão, que iniciou a militância na  Ação Popular, organização de esquerda originária dos grupos da juventude católica, foi morto, em circunstâncias não esclarecidas, quando estava em uma feira popular na cidade. Ruy, que morava em Juazeiro com o nome de Luiz Antonio Silva Moraes, foi espancado por três policiais e nunca mais foi visto. Onde foi enterrado Ruy? Quais as circunstâncias da morte? Quem o matou? São perguntas que não querem calar. 

Resta-nos indagar se não somos omissos sobre fatos semelhantes ocorridos no país e que só ganham existência para os familiares. Somos um povo sem memória, um povo que aceitou que jovens fossem mortos. Somos uma nação que se constrói sob o silêncio. Saber que um filho morreu, causa-nos dor. Muito mais dilacerante é o silêncio de não saber como morreu e quem o matou. Zuzu Angel nos convoca a sair do silêncio e a exigir justiça e transparência sobre o passado. A todos os assassinados pelo regime militar, dou-lhes minha voz e lhes digo Presente!  

P.s: Esse texto foi publicado no Gazzeta do São Francisco, em agosto de 2006. Hoje, na edição do Gazzeta do São Francisco, de 28 de Julho de 2012, a jornalista Karem Morães publicou matéria especial sobre a morte e desaparecimento de Ruy Frazão. 

Para conhecer um pouco da vida de Zuzu Angel e a sua luta em busca das circunstâncias da morte do filho, utilizando-se da sua arte como estilista e dos "desfile-protestos" para denunciar a ditadura militar, clique aqui.  

Andréa Cristiana Santos

Um comentário:

  1. Oi!!! já comecei a ler seus textos...parabéns pelo blog, depois te mando outro e-mail.!!!! um bjão

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